Marta Célia, 35 anos. Exímia advogada. Dona de uma oratória
mágica e hipnotizante.
Martinha,
como é conhecida pelos amigos do Fórum e da Faculdade, era o típico sonho de
consumo do homem contemporâneo. Fluente em cinco idiomas sabia dizer não das mais diversificadas formas devidamente
documentadas na longa odisseia histórica que é relacionar-se com o outro. E
ainda conseguia desenvolver novos projetos. Certa vez, ao ser cortejada por um
professor, foi capaz de rejeitá-lo com classe metaforizando acerca das
diferenças entre cartão telefônico e ficha. Não meu caro leitor, Martinha não
era funcionaria de companhia telefônica e tão pouco moradora de Santa Rita do
Sapucaí: era apenas inteligente ao extremo.
Dentro de
toda essa versatilidade, morava escondida em uma carapaça (e que carapaça! Um pitéu
bacana e supimpa, como diria meu tio de sessenta anos) majestosa, a insegurança
em pessoa.
Martinha
tinha um medo patológico de morrer sozinha. Ela não contava o tempo: Contava os
óvulos. A cada primavera passada, via
sua beleza juvenil ser substituída pela alcunha de monumento clássico. Uma
Vênus com braços, que ainda sim seria capaz de catar papel na ventania para
passar um dia dos namorados sendo massageada em algum motel genérico.
Tão curtos
quanto à felicidade conjugal eram seus relacionamentos pautados na cobrança. No
anseio pelo homem perfeito, Martinha deixara escapar por entre os dedos, o
garçom do piano bar, o professor de Português, o estudante de medicina e o Contador
que finalmente havia lhe tratado como um rei trata sua rainha.
Gastava horas
lendo Augusto Cury, Tati Bernardi, Caio Fernando Abreu. Delegava ao Tarô cigano, as nuances nubladas
de seu destino. Entregava-se ao café solúvel com cigarro mentolado, reafirmando
para seu subconsciente que sua sina era acariciar um gato angorá assistindo o
programa da Fátima Bernardes. Em sua mesa de almoço, um jogo americano, um
prato, um copo e a lasanha congelada.
Trinta perfumes
e cremes. Nas filas de banco, em sua
cabeça cansada, Martinha raciocinava pensando em letras de Chico Buarque. Fechada em seu mundo de autoafirmação, não
reparava na maré de olhares masculinos em sua saia hippie e em seu coque que
deixava escapar uma mecha castanha por entre os olhos negros. Era uma mulher poderosa,
envolta em suas fraquezas mais comuns. A solidão facultativa era sua
criptonita.
Repentinamente,
sente vibrar seu telefone dentro da bolsa, rompendo as muralhas de sua
introspectiva realidade: Seria o seu Contador clamando pelos seus dedos
adornados minuciosamente com o sensual azul marinho Giovanna Antonelli
entrelaçando os dele?
Infelizmente
não. Era um lembrete da consulta marcada com a Vidente indicando o horário de
Quatorze Horas. Era hora de mudar a postura? Não.
Acrescentou oitenta reais ao saque para pagar o sobrenatural e foi
embora.