Pendurado num cabide randômico, desses
vendidos em pacotes, um terno cinza sem marca. A calça de linho, já havia
vestido, e encontrava-se nesse exato momento, calçando os sapatos quase
engraxados, o que se resolveria apenas com um leve atrito da flanela e pronto.
Foi até o
banheiro, e com a toalha envolvida no pescoço, começou a se barbear. Barba de uma semana. Desleixo cotidiano.
Vestiu a camisa xadrez, acertou o nó da gravata, e com duas mãos de loção mentolada,
terminou de se arrumar.
Descendo as
escadas de madeira do casarão antigo em que morava (como tudo que possuía em
sua vida, datado de remotos tempos em que as coisas eram feitas para durar,
inclusive os amores) ele pensava em quanta solidão lhe sobrara ao longo dos
anos. Quando jovem, amou uma, duas, três vezes.
De dois desses amores, filhos que já não via. Do terceiro, a aliança na
carteira, única lembrança de sua ausente companheira.
Tira então do
bolso, a chave do fusca 68. Ao entrar em seu carro, presta atenção nas sábias
palavras de Altemar Dutra, afirmando ser sentimental. E ele também era. Abraçara a vaidade aquele ultimo dia do ano,
para tentar de vez, encontrar na vida, graça para continuar.
Enquanto
cortava as ruas confusas de Belo Horizonte rumo ao baile da terceira idade,
cogitava possibilidades variadas para mudar seu destino. Em determinado ponto,
por sobre um viaduto, parou. Sentou no parapeito, e numa suicida postura, aos
olhares de gente que passava lá embaixo, apenas tirou um cigarro do maço,
acendeu e optou por se matar lentamente. Nada mais digno.
Fumou em cinco
tragos. Voltou a dirigir.
E nas
reflexões de quanto faz feliz ou o quanto faz sofrer um grande amor, parou em
frente ao Clube. Pelos portões de
madeira, entrou garboso como um jatobá, imponente, sustentado pela dureza da
vida e do coração. Casais dançavam
embalados apenas por um jovem cantor e seus companheiros de banda.
No balcão, a
cada alcalina golada em seu uísque, remoía sentimentos. Foi quando repentinamente, ele notou na outra
extremidade, um olhar como o seu. Cansado. Sem brilho, mas transbordando
vontade de um ponto final. E percebeu
então, que seus olhares enfim, se cruzaram.
Tomou coragem,
e mais um uísque. Sentou ao lado dela. E
ali, conversaram. Inevitável como
deveria ser, levantaram-se e de mãos dadas, foram dançar. Dedos cansados das mágoas e desilusões
passadas em diferentes décadas se apertavam em um misto de carinho e desespero. – Por favor, não me solte.
Sorriram.
Nos dez últimos
segundos daquele ano, perceberam, que apesar das rugas e dos cabelos grisalhos,
ainda tinham chance. E como jovens, resolveram tentar uma ultima vez.
Uma ultima e derradeira
tentativa... Talvez a mais sincera de todas.
E viveram
felizes os primeiros minutos de 2014.
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