Os Dois Reais e a saudade dela.
Saudade dela é tipo quarenta graus numa segunda feira. Um bolso furado no qual você perde o passe do ônibus. É um sorvete que cai no chão. Um céu cheio de pardais safados furtando pipoca dos pombos. É ir pra praça e não encontrar um banco sequer. Prender o cartão no caixa eletrônico.
Saudade dela é tipo um copo de cerveja quente. É tentar fugir do chato que muito fala e nada tem a dizer, no entanto insiste em dialogar aquele discurso pra boi dormir, cuspindo na sua cara. E segurar pra não espirrar enquanto está discursando em uma palestra.
E o mundo todo vai conspirando contra. Locais diferentes, aonde você procura a razão, encontra a dúvida, o medo. E depois de tudo, naquele curto espaço de tempo em que pensa cair de joelhos, sente vibrar o celular, em sinal de mensagem. Olha, hipnotizado por um display de um aparelhinho que geralmente só traz gasto e tristeza. E qual não é sua surpresa, quando lê que seus créditos expiram hoje. E você só tem dois reais de crédito.
Saudade dela é ser sempre cordial, mesmo tendo vontade de espancar meio mundo. É dar o lugar ao idoso, mesmo que o idoso tenha uma saúde muito melhor que a sua. É cheirar o cigarro de fumo de corda enrolado com papel de pão e não poder reclamar. É sentir o planeta Terra cada vez mais cheio de gás carbônico e não conseguir atravessar a rua de jeito nenhum.
Pulando mendigos, granadas caninas (vulga caquinha), você vai comprar pão. Quase quebra sua chave na porta de casa, o telemarketing te liga, a TV não pega. Então você se lembra dos dois reais de credito. Vai perder a promoção. Toma seu calmante e vai se deitar...
Lá pras quatro da manhã, perde o sono. Olha pela janela, e sente ainda mais saudade dela.
Com dois reais, você poderia ter feito tudo diferente. E por pouco não fez...
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